Benjamin havia acabado de completar sete anos.
Era do tipo de criança que via mágica nas coisas pequenas. Tinha um olhar que reparava em tudo: nas formigas que faziam fila no muro, nas folhas que dançavam no chão, nos sorrisos que escapavam sem querer.
E tinha também um costume curioso: guardava tesouros nos bolsos. Botões coloridos, tampinhas brilhantes, pedrinhas em forma de coração...
— Nem tudo que brilha é ouro — dizia ele. — Mas às vezes é tesouro.
Numa tarde em que o vento soprava diferente, Benjamin decidiu voltar da escola por outro caminho. Só pra ver o mundo com outros olhos.
Foi então que viu, no cantinho de uma praça esquecida, duas crianças pulando corda com um barbante velho.
Eles riam tanto que parecia que o céu sorria também.
Benjamin parou. Observou. O vento soprou mais uma vez, como se dissesse baixinho:
— Veja com o coração.
Ele se aproximou devagar.
— Oi... — disse Benjamin, com a voz curiosa.
As duas crianças pararam de pular. Uma era menina, tinha cabelo crespo preso com fitinhas coloridas. O outro, um menino magrinho com olhos que brilhavam como vagalumes.
— Oi! — responderam os dois, sorrindo.
— Vocês moram aqui perto? — perguntou Benjamin.
A menina olhou para o céu e respondeu, com leveza:
— A gente mora onde o céu cobre. Nosso teto muda com as estrelas.
Benjamin ficou em silêncio por um instante.
— E brinquedos, vocês têm?
— A gente inventa — disse o menino. — O vento traz pedaços de brincadeira. E a gente monta com o que tiver.
Benjamin sorriu. Tirou do bolso uma pedrinha azul, tão lisa que parecia de vidro.
— Querem um tesouro?
Os olhos dos dois brilharam.
— Tesouro? — repetiu a menina, com um sorriso largo.
— É sim. Dizem que quem carrega essa pedrinha nunca esquece de olhar com o coração.
O menino pegou a pedrinha com cuidado, como se fosse um ovo de passarinho.
— Obrigado, Benjamin! — disse ela, com um brilho nos olhos.

Desde esse dia, Benjamin começou a voltar àquela praça sempre que podia. Levava livros, histórias inventadas, bolinhos que sobravam do lanche e mais alguns tesouros do bolso.
Em troca, aprendeu brincadeiras novas, ouviu cantigas diferentes e descobriu um mundo que não existia em nenhum livro da escola.
Um dia, quando chegou em casa, contou tudo à sua avó, Dona Aurora. Ela ouviu em silêncio, com os olhos marejados e o coração cheio.
— Vó... acho que eu queria fazer mais do que contar histórias. Queria deixar presentes invisíveis pra outras crianças como eles...
Dona Aurora sorriu, com um olhar que parecia entender tudo.
— Meu querido, o maior tesouro que podemos dar é o amor. E às vezes, ele vem disfarçado de pequenas coisas.
Benjamin pensou por um momento e teve uma ideia.
— Então vamos costurar mochilas mágicas. Dentro delas, a gente põe o que puder: roupas, brinquedos, um lanche e uma carta com palavras quentinhas.
Dona Aurora sorriu, admirada.
— Você é mesmo um menino especial, Benjamin. Vamos fazer isso juntos. Melhor, vamos chamar os amiguinhos da escola para ajudar. Assim, eles também vão aprender a ver o mundo com outros olhos.
Benjamin chamou seus amigos da escola. Todos aceitaram como quem topa entrar numa aventura de verdade, daquelas com mapas do coração e bússolas de bondade.
Os amigos de Benjamin, com mochilas cheias de curiosidade e corações abertos como janelas em manhã de sol, aceitaram o convite sem pensar duas vezes. Foram todos, como se embarcassem numa expedição mágica para um lugar onde as brincadeiras nasciam do vento e os sorrisos eram feitos de coisas invisíveis. Não levavam brinquedos caros, mas sim palavras novas, desenhos feitos à mão e bolinhos amassados que ainda guardavam o cheiro do carinho de casa.

Na praça, os mundos se encontraram sem estranhamento. Um menino da escola ensinou a jogar “esconde-pedra”, e o outro aprendeu a fazer pipa com jornal e linha de costura. Uma das meninas ofereceu sua pulseira de miçangas dizendo: “É um amuleto contra dias tristes.” Em troca, ganhou uma flor de papel feita com a paciência de quem espera o sol chegar. Era como se todas as crianças falassem a mesma língua — a língua que só quem sabe imaginar entende. E ali, entre folhas secas, gargalhadas e pés descalços correndo atrás de nuvens, nasceu um tipo de amizade que não cabe em foto, só no coração.
As mochilas foram ganhando vida: enchiam-se de mantas, brinquedos simples, palavras doces e pequenos “tesouros invisíveis”, que as crianças espalhavam pela cidade como quem planta esperança em terrenos baldios.
Benjamin nunca esqueceu seus dois primeiros amigos da praça. Às vezes os encontrava. Outras vezes, só sentia o vento soprar, como naquele primeiro dia.
E sempre que encontrava uma nova pedrinha em forma de coração, guardava no bolso, sussurrando:
— Nem tudo que brilha é ouro... mas às vezes é tesouro.
"A solidariedade é o tesouro que não se vê com os olhos, mas com o coração."