Chico Júnior era um filhote de papagaio tão falante que parecia ter mil sinos dentro do peito, todos tilintando ao mesmo tempo. Suas penas tinham todas as cores da festa do sol, e suas palavras voavam mais longe que o mais veloz dos beija-flores.
Conversava com a brisa, com as nuvens, com as pedras que cochilavam sob o rio. Na floresta, todos diziam que Chico tinha nascido com um arco-íris no bico.
Mas num certo dia nublado — e não era só o céu que estava assim —, algo mudou.
O Vento Que Mudou de Direção
Seus pais, o Sr. Chico, o Papagaio e a Sra. Gracinha, a Papagaia... chamaram-no para uma conversa de galho baixo, dessas que a gente só faz quando o coração pesa.
— Filhinho... — disse o Sr. Papagaio, com o olhar perdido entre as folhas — às vezes, mesmo quando duas aves se amam muito, o voo delas começa a seguir rumos diferentes.
Chico tentou entender. Mas era como tentar segurar água com as garras.
— Nós vamos morar em árvores diferentes agora
— explicou a Sra. Papagaia, com a voz embargada como uma canção que se esqueceu da melodia.
E então aconteceu.

A Tempestade do Coração
Foi como se uma nuvem carregada e barulhenta surgisse bem em cima da cabeça de Chico Júnior.
Relâmpagos cortavam o céu de seus pensamentos. Os trovões faziam tanto barulho que ele não conseguia mais ouvir os sorrisos dos outros.
As palavras, aquelas que antes dançavam nos galhos, sumiram. Ele não quis mais cantar. Nem conversar. Nem abrir o bico. O arco-íris do peito se escondeu atrás de uma nuvem escura chamada tristeza.

A Papagaia Azul do Silêncio Calmo
Dias depois, quando os galhos já nem balançavam mais, apareceu Dona Carolis.
Ela era uma papagaia azul como o céu logo depois da chuva. Seus olhos tinham a calma de uma rede no fim da tarde. Dizia pouco. Mas enxergava muito.
— Você pode me mostrar como está se sentindo?
— perguntou ela, oferecendo não palavras, mas cores.
Chico pegou os lápis. No papel, saiu uma tempestade com raios, vento e um coração encolhido no canto.
— Às vezes, é no desenho que a voz encontra coragem pra voltar — disse Dona Carolis, sorrindo com os olhos, e num tom de voz que transmitia serenidade e paz.

O Desabrochar das Palavras
Dia após dia, Chico foi pintando menos nuvens e mais janelas. Menos trovões e mais guarda-chuvas. Menos silêncio e mais esperança.
Dona Carolis sussurrava frases que tinham gosto de cura: — Você não tem culpa. — Seus pais continuam amando você, mesmo em árvores separadas. — É possível amar os dois com todo o coração, sem quebrá-lo ao meio.

O Primeiro “Oi”
Numa manhã em que o sol brincava de esconde-esconde nas folhas, Chico olhou para o céu e percebeu que a nuvem estava menor. Mais leve. Quase transparente.
Ele respirou bem fundo — como quem recolhe as palavras do fundo do peito — e disse:
— Oi.
Foi só isso. Mas esse "oi" foi como o primeiro raio de sol depois da chuva. Um raio tímido, mas quente. Que aquece devagar e, quando a gente menos espera, faz nascer flor onde antes havia poça.
No dia seguinte, ele voou até Dona Carolis, que o esperava com um sorriso que abraçava sem tocar.
— Obrigado... — disse ele.

E nesse momento, o arco-íris do seu bico voltou a brilhar. Colorido. Alegre. E cheio de novas palavras.
Algumas palavras doíam, sim. Outras faziam cócegas. Mas agora Chico sabia: mesmo quando os ventos mudam, o voo pode continuar bonito.